
Quando eu era criança, meu avô costumava se sentar na varanda com seu velho rádio de pilha. Ele tinha um ritual: todo fim de tarde, colocava para tocar as músicas que marcaram sua juventude. “Isso aqui me leva de volta no tempo”, ele dizia, sorrindo. Eu não entendia muito bem naquela época, mas hoje sei que aquelas canções não eram apenas um passatempo, eram sua conexão com as memórias, com a alegria e, de certa forma, com a saúde mental.
Com o passar dos anos, vi como a música foi essencial para ele e para os amigos que fizemos no asilo onde costumávamos visitar. Alguns recuperavam lembranças que pareciam perdidas, outros se emocionavam com as melodias e muitos simplesmente se animavam ao ouvir um bom samba ou um bolero antigo. Foi aí que descobri o poder da terapia musical para idosos.
Hoje, quero compartilhar um pouco dessa experiência e contar como a música pode transformar a vida na terceira idade.
O Que é a Terapia Musical?
A primeira vez que ouvi o termo terapia musical, achei que fosse algo complexo, feito apenas por especialistas. Mas a verdade é que qualquer um pode trazer os benefícios da música para a vida dos idosos.
A terapia musical é basicamente o uso da música para melhorar o bem-estar físico, mental e emocional. Não se trata apenas de ouvir uma canção, mas de interagir com os sons, cantar, dançar ou até tocar um instrumento. É uma forma de estimular o cérebro, resgatar emoções e trazer mais qualidade de vida.
Meu avô, por exemplo, tinha um amigo chamado Seu João, que sofria de Alzheimer. Ele costumava ficar em silêncio por longos períodos, até que um dia, em um dos nossos encontros, um cuidador colocou um samba antigo para tocar. De repente, os olhos dele brilharam e ele começou a balbuciar a letra da música. Foi um momento emocionante. A melodia despertou algo nele, uma lembrança feliz escondida no fundo da memória.
Os Benefícios da Terapia Musical para Idosos
Sei que parece mágico, mas os benefícios da música para os idosos são comprovados pela ciência. Entre os principais efeitos positivos, posso destacar:
Melhoria na saúde mental e emocional: Sempre que meu avô ouvia suas músicas favoritas, percebia como seu humor mudava. Ele ficava mais leve, mais falante. A música tem esse poder de reduzir a ansiedade e trazer alegria.
Estímulo cognitivo: Vi amigos do meu avô que tinham dificuldade em lembrar nomes e datas, mas que conseguiam cantar músicas inteiras de décadas atrás. Isso porque a música ativa áreas do cérebro responsáveis pela memória.
Bem-estar físico: A música também incentiva o movimento. Mesmo aqueles que têm dificuldades de locomoção podem acompanhar o ritmo com as mãos ou cantar, o que já melhora a respiração e a circulação sanguínea.
Socialização: Nos encontros do asilo, a música era um grande motivo de união. Era incrível ver como uma simples roda de violão fazia todos se conectarem, conversarem e rirem juntos.
Como a Música Atua no Cérebro dos Idosos?
Se tem uma coisa que aprendi com meu avô e seus amigos é que a música mexe com a alma, mas também com o cérebro.
Quando ouvimos uma canção que gostamos, nosso cérebro libera dopamina, que é um neurotransmissor ligado ao prazer. Isso explica por que nos sentimos bem ao escutar uma música querida.
Além disso, a música ativa o hipocampo, região do cérebro associada à memória. Isso quer dizer que, mesmo quando uma pessoa tem dificuldades cognitivas, como no caso do Alzheimer, a música pode ajudar a recuperar memórias e facilitar a comunicação.
Foi exatamente isso que vi acontecer com Seu João. Ele pode não lembrar o que almoçou, mas se alguém toca uma música da sua juventude, ele canta junto sem hesitar.
Diferentes Formas de Terapia Musical
O mais legal da terapia musical é que existem várias formas de aplicá-la. Cada idoso pode encontrar a que mais gosta:
🎵 Ouvir música: Simples, mas muito poderoso. Criar uma playlist com músicas favoritas pode trazer conforto e bem-estar.
🎶 Cantar: Meu avô adorava cantarolar enquanto fazia as coisas do dia a dia. Cantar ajuda na respiração e melhora a articulação das palavras.
🎸 Tocar um instrumento: Se o idoso souber tocar algo, incentivar essa prática pode ser uma ótima forma de exercício mental e físico.
💃 Dançar: Mesmo que seja só um balanço no ritmo da música, dançar é um ótimo exercício para manter a disposição e a mobilidade.
Como Incluir a Música na Rotina dos Idosos?
Se você tem um idoso na família, aqui vão algumas dicas que aprendi na prática:
Crie uma playlist personalizada. Pegue as músicas que ele gosta e monte uma seleção no Spotify ou no YouTube.
Toque música em momentos estratégicos. Pela manhã, para começar o dia com energia, e à noite, para relaxar antes de dormir.
Incentive a participação em grupos musicais. Corais para idosos são uma ótima opção!
Deixe um rádio ou caixinha de som acessível. Assim, ele pode escolher o que quer ouvir.
Cante junto! Mesmo que desafinado, vale a pena compartilhar esse momento.
Eu costumava colocar músicas antigas para tocar enquanto preparava o café da tarde com meu avô. Ele sempre sorria ao ouvir as primeiras notas de alguma canção que marcou sua vida.
Histórias Que Provam o Poder da Música
Uma das experiências mais emocionantes que vivi foi quando fizemos um “baile da saudade” no asilo. Reunimos os idosos, colocamos músicas dos anos 50 e 60 e deixamos que a mágica acontecesse.
Houve dança, risadas, até lágrimas de emoção. Uma senhora chamada Dona Estela, que raramente falava, pegou minha mão e disse: “Essa era a música do meu casamento. Eu e meu marido dançamos ela naquela noite. Obrigada por me trazer essa lembrança.”
São momentos como esse que me fazem acreditar que a música realmente cura.
A música tem o poder de atravessar o tempo e conectar gerações. Ela traz conforto, alegria e memórias. Vi isso no meu avô, nos amigos que ele fez e em tantos idosos que descobriram o valor da terapia musical.
Se você tem um idoso na família, experimente trazer mais música para o dia a dia dele. Pode ser algo simples, como tocar uma canção especial ou cantar junto. Mas acredite: para eles, isso pode significar muito mais.
Afinal, as notas que curam estão por toda parte, basta apertar o play. 🎶